sexta-feira, 19 de julho de 2013

Procuram-se amigos cinéfilos desesperadamente

Li o texto de Ricardo Cota, no site Criticos.com, na semana passada e não me contive. A vontade de compartilhá-lo foi imediata. Mas não podia ser no facebook ou em qualquer outra rede social que não permite expressar o motivo da comoção apropriadamente. Por lá, só mesmo imagens rendem leituras, sempre apressadas. Resolvi, então, publicá-lo aqui.

Gosto bastante de cinema e teatro, a ponto de frequentar as salas quase todos os fins de semana. Às vezes, eu e meu esposo vamos ao cinema e ao teatro no mesmo fim de semana. Para nós, é uma programação padrão. Quando não tem uma opção de lazer que nos cause maior ansiedade, escolhemos teatro e/ou cinema. Quando estamos com preguiça de sair de casa, assistimos a filmes deitados na cama, enrolados no lençol. Mesmo se o filme ou a peça não agradar, o programa em si sempre nos agrada. Comentar sobre o que acabamos de assistir é algo que adoramos fazer. Só lamentamos quase sempre fazê-lo sozinhos.

Temos pouquíssimos amigos que topam curtir o escurinho do cinema facilmente. Para estarmos acompanhados, o filme escolhido deve ser um blockbuster. Se dissermos que vamos à Sala de Arte -- circuito de filmes alternativos, tidos como cult, de Salvador --, não importa a qual filme pretendemos assistir. Ele sempre será chato, monótono, feito para "intelectuais". Certa vez, um colega de trabalho disse que não frequentava a Sala de Arte porque ia ao cinema para se divertir, não para "filosofar". Eu indaguei imediatamente: "Mas por quê não as duas coisas?" Ou, por quê não diversão numa noite e "filosofia" numa outra?

Tal lamento não enseja "superioridade cultural". É muito mais uma queixa de não conhecer pessoas que gostem de arte sem atrelá-la sempre a entretenimento. É óbvio que gosto de entretenimento. Costumamos assistir de blockbuster a avant-garde. Nossa paixão é por cinema. Em nenhum momento desejamos que os outros tenham o mesmo gosto que nós temos. Se gostamos de comédia romântica, por exemplo, assistimos ao gênero produzido por Hollywood, mas também por franceses, ingleses, canadenses, argentinos, etc. Por que se limitar a uma indústria cinematográfica, a uma única forma narrativa, a um único caminho para a fruição? A questão colocada aqui diz respeito a "sair da caixinha de fósforo". Se quiser, estendo a mão. Vem, Alice, queremos sua companhia.




“AMOUR NÃO!”

Por Ricardo Cota

Recentemente li uma colunista, que pessoalmente desconheço, escrever que após assistir Amour numa sessão de segunda-feira à noite foi surpreendida pelos comentários do marido irritado: “por que ver esse filme agora? Você mal acabou de passar por isso? Por que mais sofrer?” Há uns meses atrás, uma querida amiga, no intervalo do ótimo musical metafísico “Quase Normal”, a caminho do baleiro sussurrou-me: "ainda bem que minha mãe não veio”.

Todos estão certos em suas observações.

Tanto Amour, crônica da finitude, quanto Quase Normal, musical da depressão pós-traumática, são obras de arte maravilhosas, de qualidade estética reconhecíveis, ainda que questionáveis do ponto de vista da melhor crítica. Mas a pergunta é: são obras recomendáveis? E, afinal de contas, o que é uma obra de arte recomendável?

Meus amigos de crítica, que a esta altura já estão cascudos, sabem o quanto é difícil responder a pergunta de pessoas queridas, que na maioria das vezes não vivem a experiência artística cotidianamente como nós, mas questionam legitimamente: “e aí, que filme você recomenda?

E quase sempre recomendamos o filme que destrói o fim de semana do sujeito, que amarga o jantar combinado com os amigos. Lembro de um primo que uma vez chegou para mim e disse: “poxa, aquele filme que você recomendou estragou o meu sábado!”

Para nós, críticos e humanos, a questão envolve o conceito de ética. Respondo a este ser que respeito e admiro o que realmente penso ou respondo com aquele ar de presunção: “acho que você não vai gostar”.

Sempre que me vejo diante deste tipo de resposta me identifico com a indignação. “Quem é você para dizer se eu vou ou não gostar de tal filme?” O problema é que o cidadão retorna ainda mais indignado do cinema : “Pô, que merda de filme você me indicou”.

A ex-mulher de um amigo, figuraça, do tipo opinião eloquente, uma vez me olhou à saída de um filme e gritou: “Cotinha, meu querido, gosto tanto de cinema quanto você. Agora, aqui entre nós, nada de Bergman, NADA DE BERGMAN!!!” Nos abraçamos e rimos numa felicidade alienada que jamais esqueço. Ela odiava Bergman; eu delirava com sua sinceridade. Para ela, minha opinião sobre Bergman e merda eram a mesma coisa. Para mim a opinião dela...

Podemos nos confortar com o conceito comum de arte como entretenimento, como couvert da noite que se abre, mas não podemos fugir do poder que a arte tem de, no pequeno gesto do bailarino, no menor solfejo do intérprete, na filigrana da letra da canção, no enredo do samba que não entendi, no argumento do filme, na cena final da peça, expor-nos aos anjos e demônios que nos cercam. Quem não quer passar por isso, que marque o encontro direto no restaurante.

E seja feliz.

Um comentário:

  1. Eu gosto de cinema, por mim iria toda semana também, e não vou ver muitos blockbusters (mais pelo fato de, com certeza, passarem na tv na cabo em poucos meses, então economizo essa grana). Não posso ser considerada cinéfila nem de longe, mas gosto de filmes que nos fazem pensar. Meu desafio maior é convencer o marido a sair do sofá pra ir pro cinema de vez em quando :)

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